quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O medo

Há pouco estava refletindo sobre o por que de eu fazer esculturas. Gostar pareceu um pouco vago para os critérios do meu momento meditativo. Amanhã, tudo bem, mas para o agora recente não estava suficiente. Olhando algumas fotos pensava, tá e daí? Posso ter bons motivos para quase todas elas, mas A Culpa fugia um pouco da justificativa, mesmo do mero gostar. Digo em relação ao tema, gostar da culpa? Estranho!
Por estapafúrdia que seja, nessas horas eu preciso de uma explicação, uma linha de raciocínio mínima. No meu modo de ver, a culpa anda par e passo com o medo. Hum, pensei, o medo. Que raios das profundas é o medo afinal?
Antes de qualquer viagem, fui ao pai dos burros. Sempre há o que aprender, ou lembrar. Eis que algumas definições saltaram aos olhos, tais como: ansiedade irracional (uma derivação figurada para ansiedade é: desejo veemente [mas desejo é uma aspiração humana de preencher um sentimento de falta]). Logo, o medo é uma necessidade urgente e emotiva (irracional) de preencher um vazio. Hum, bom. O medo também é uma visão aterradora (aterrador - que ou o que aterra [aterrar - atirar por terra, derrubar]). Então é uma imagem que imobiliza. Por outro lado, o medo também se define por uma apreensão (assimilação ou compreensão do que é cognoscível [que pode ser conhecido], percepção). Assim, o medo pode ser uma forma de aprendizado, de entendimento, não necessariamente correto, diga-se de passagem. Além disso, o medo é desassossego (o oposto de repouso), portanto ação. Aí teríamos que considerar os níveis, um medo excessivo, imobiliza, um medo brando, estimula. Por fim, para um melhor entendimento, fui ao antônimo do medo, que é: coragem. Etimologicamente, coragem vem do francês coeur (coração). Interessante, pensei eu!
E a culpa? Causa de tudo isso. Culpa é falta, delito, erro. Também pecado, que se caracteriza por ação e omissão. Mas acima de tudo, culpa é a consciência da falta, do erro.
Empregando uma lógica mais aritmética, considerando que culpa é falta (a=b e b=a) e substituirmos na definição de desejo a falta por culpa, teremos que desejo = aspiração humana de preencher um sentimento de... culpa. Na religião a associação de desejo e culpa é reforçada e instituída, mas jamais compreendida. Quando desejamos, sentimos falta, mas não necessariamente entendemos esta falta. Quando tememos também sentimos falta. Nos dois casos há um desequilíbrio de necessidades, portanto um erro subjetivo. E da consciência desta situação nos vem a culpa, que pode ser própria ou de terceiros. Nosso século tem particular preferência por esta última.
Quando eu esculpi A Culpa, eu tinha uma noção de que os erros, quaisquer que sejam, não podem ser tão poderosos que nos façam esquivar uma situação. Na culpa, a consciência dos erros, não pode haver um medo aterrador, que nos imobilize. O medo deve ser apreensão, pois que nos permite perceber e conhecer com os erros. A culpa não como carrasco, mas como mestre. Que infla o coração, que ventila coragem para enfrentá-los. Aliás é o coração que nos permite amar, e é amando que manifestamos coragem.
Quando decidi esculpir a culpa, há quase 4 anos, lembro de ter escrito num caderno de notas algo assim: "Devemos amar nossos erros, para que não sejam inimigos que nos impeçam de acertar."
Ou algo assim.

3 comentários:

  1. Adoro a 'Culpa esculpida', hehehe... Entendo como você vê as coisas, mesmo não concordando com algumas (claro!! A maaaala!) – principalmente sobre 'a culpa como mestre'. =)

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  2. rsrsrs, td bem, mas a culpa, assim como a satisfação, o orgulho são experiências, melhor, são interpretações de experiências. Não há como não serem um ponto de referência para pensamentos e atitudes futuros. Ao menos eu não vejo como.

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  3. Ponto de referência, concordo com você. Para o bem ou para o mal, né? – se bem que, em se tratando de sentimento de culpa, é geralmente para o mal, heheheeheh. Mas ainda acho isso diferente de "culpa como mestre"...

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